segunda-feira, 25 de março de 2013

Aldeia Maracanã: É assim que se faz uma Copa?


O Governo Cabral, no estado do Rio de Janeiro, mais uma vez trata a questão social como questão de polícia, na ação de despejo da Aldeia Maracanã. É a Copa do Mundo higienista com os pobres e racista com os índios. O histórico Museu do Índio dando lugar a um "Museu Olímpico", o que demonstra bem quais são as prioridades dos megaeventos. Uma aldeia sendo destruída, e o que oferecem aos índios são uns lotes precários ou, pasmem, moradia em hotel! E ainda teve quem disse: "mas os índios e indigenistas são inflexíveis, não aceitam nenhum acordo"... Até mesmo parlamentares apanharam: o governo Cabral surpreendendo cada vez mais ao extrapolar limites. 

"Cada vez que se comete um ato de violência que coloca em risco a integridade de um grupo social indígena, se esfacela sua cultura, seu modo de vida, suas possibilidades de expressão. É uma porta que se fecha para o conhecimento da humanidade, como dizia Levi-Strauss. É essa a Copa do Mundo que o governo quer fazer?". O comentário é de Fernanda Sánchez, professora da Universidade Federal Fluminense – UFF, em artigo publicado no jornal Brasil de Fato, 22-03-2013.

Eis o artigo.

Nesta sexta-feira, o Batalhão de Choque da Polícia Militar invadiu a Aldeia Maracanã, antigo Museu do Índio, e agiu com extraordinária truculência. Os policiais jogaram bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo, gás pimenta, bateram nos manifestantes e prenderam ativistas e estudantes. A Aldeia estava ocupada desde o ano de 2006 por grupos representativos de diferentes nações indígenas que, nos últimos tempos, diante do projeto de demolição do prédio (para aumentar a área de dispersão do Estádio do Maracanã, estacionamento e shopping), vinham resistindo.

As lideranças indígenas são apoiadas por diversos movimentos sociais, estudantes, pesquisadores, universidades, comitês populares, organizações nacionais e internacionais de defesa dos Direitos Humanos, redes internacionais e outras organizações da sociedade civil. A luta dos índios e o conflito estabelecido entre o governo e o movimento resultaram num importante recuo do governo, que diante da pressão social desistiu da demolição do prédio e passou a defender a sua “preservação”. A desocupação do prédio foi decretada, com hora marcada. Os índios, no entanto, continuaram a resistir, apoiados por diversas organizações.

Certamente essa posição política ensina muito mais aos cidadãos cariocas e ao mundo sobre preservação, direitos e cidades do que as violentas ações que vêm sendo mostradas nos diversos meios. Para os índios e para as organizações que os apoiam, preservar o prédio vai muito além de preservar sua materialidade. A essência da preservação, neste caso como em muitos outros, está na preservação das relações sociais, usos e apropriações que lhe dão sentido e conteúdo. Seria um exemplo para o Brasil e para o mundo a preservação da Aldeia Maracanã, o reconhecimento de seu uso social e a pactuação democrática acerca da reabilitação arquitetônica do edifício.

Cada vez que se comete um ato de violência que coloca em risco a integridade de um grupo social indígena, se esfacela sua cultura, seu modo de vida, suas possibilidades de expressão. É uma porta que se fecha para o conhecimento da humanidade, como dizia Levi-Strauss. É essa a Copa do Mundo que o governo quer fazer? É esse espetáculo da violência, a lição civilizatória que o Rio de Janeiro tem para mostrar ao mundo? A política-espetáculo tem um efeito simbólico: mostrar que o avanço do projeto de cidade, rumo aos megaeventos esportivos, será feito a qualquer custo.

Direitos humanos, democracia e pactuação estão fora da agenda deste projeto de cidade. Os manifestantes, em absoluta condição de desigualdade frente à força policial e seu aparato de violência, lançaram mão de instrumentos bem diferentes daqueles utilizados pelo Batalhão de Choque: ocuparam o prédio para apoiar os índios, resistiram à sua desocupação e manifestaram, no espaço público, nas ruas e avenidas do entorno do complexo do Maracanã, sua reprovação e indignação frente à marcha violenta desta política.

E mais:

Clique no link abaixo e assista o vídeo da Asduerj com diversos relatos acerca dos acontecimentos:
Massacre Aldeia Maracanã

*Retirado do IHU Online
**Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 24/03/2013

quarta-feira, 20 de março de 2013

Manifesto de Repúdio à Proposta do Governo Federal de Subsidiar os Planos Privados de Saúde



A Frente Nacional contra a Privatização da Saúde repudia o conjunto de medidas que, segundo notícia veiculada na Folha de São Paulo em 27/02/2013, o Governo Federal prepara desde o início do ano e que amplia a trilha da privatização da saúde em curso, através da radicalização do favorecimento já amplo ao mercado de planos e seguros de saúde.

Na reportagem é relatado que a própria Presidenta, pessoalmente, vem negociando com grandes empresas que atuam no mercado de planos privados de saúde – a maioria controlada ou com grande participação do capital estrangeiro e grandes doadoras da campanha presidencial de Dilma Rousseff – um pacote de medidas que transferirão mais recursos públicos para suas já vultosas carteiras através de redução de impostos, novas linhas de financiamento e outros subsídios a expansão do seu mercado.

Tal proposta consistiria na prática em universalizar o acesso à saúde das pessoas através de planos e seguros privados, e não através de serviços públicos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). O preceito constitucional da saúde como direito é ferido mortalmente, ao ser substituído por uma abordagem da Saúde como mercadoria a ser mais amplamente consumida, especialmente para as chamadas classes C e D, para impulsionar o atual modelo de desenvolvimento.

Esta pode ser a formalização final para a instituição de um seguro saúde e criação de um Sistema Nacional de Saúde integrado com o setor privado, tendo como consequência acabar com o SUS ou torná-lo um sistema focalizado, consagrando o processo de universalização excludente que vem ocorrendo desde os anos 1990 com a saída dos trabalhadores melhores remunerados, que foram impulsionados à compra de serviços no mercado privado devido ao sucateamento do SUS. Esse movimento faz parte do mesmo processo de aprofundamento da subordinação do país ao grande capital financeiro, atrelado aos interesses do imperialismo. Contra fatos não há argumentos: há um crescimento no número de usuários de planos de saúde de 34,5 milhões, em 2000, para 47,8 milhões, em 2011, tendo o Brasil se tornado o 2º mercado mundial de seguros privados, perdendo apenas para os Estados Unidos da América.

A referida medida que beneficia os planos privados é anunciada poucos meses depois da venda de 90% da AMIL, maior operadora de planos privados de saúde do Brasil, para a empresa norte-americana United Health, e do anúncio do seu fundador, Edson Godoy Bueno (um dos maiores bilionários brasileiros) da meta destes planos atingirem 50% da população brasileira, ou seja, duplicar a sua cobertura para 100 milhões de brasileiros. A estratégia anunciada pela United Health para o Brasil é crescer entre o público de baixa renda.

Tal política não responde aos interesses da maioria da Nação: sistemas de saúde controlados pelo mercado são caros, deixam de fora idosos, pobres e doentes; são burocratizados e desumanizados, pois as pessoas são tratadas como mercadorias. Se o SUS hoje não responde aos anseios populares por uma saúde universal de qualidade, de acordo com a Constituição de 1988, não é pelas deficiências do modelo - há modelos de sistemas universais como Reino Unido e Cuba, amplamente bem considerados pela população e com indicadores de saúde melhores do que o sistema de mercado da nação mais rica do planeta, os EUA – mas porque os governos não alocam recursos suficientes, não cumprem a legislação e porque a democracia, expressa no controle da sociedade sobre o sistema de saúde, não é respeitada.

O que se constata é que o Estado está cada vez mais mínimo para o SUS e máximo para o mercado. A privatização desta vez não é de forma travestida de modernização da gestão, como no caso dos “novos” modelos de gerenciamento: Organizações Sociais (OSs), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs), Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) e Parcerias Público-Privada (PPPs). Ou mesmo na forma da complementariedade invertida, em que a rede privada, em vez de ser complementar à pública, tem absorvido 62% dos recursos públicos destinados aos procedimentos de alta e média complexidade, através de convênios e contratação de serviços da rede privada pelo SUS.

A atual inflexão, se confirmada, vaticina uma total derrota do Movimento da Reforma Sanitária, que na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986) defendia uma progressiva estatização do setor, pois o inverso é que se materializaria. Tornar-se-ia absoluta, e em níveis nunca antes vistos nesse país, a tendência da nossa história recente de alocar cada vez mais os fundos públicos para o setor privado da saúde, em detrimento da ampliação do setor público para a garantia do direito de todos à saúde e do dever do Estado de prestar serviços à população.

Por que o governo tem recursos para subsidiar o setor privado, mas alega não ter para ampliar a rede pública de saúde? 

Por que o governo não atende às demandas dos movimentos sociais, das Conferências Nacionais de Saúde e dos Conselhos de Saúde para destinar 10% da receita corrente bruta da União para a saúde pública? 

Por que a regulamentação da Emenda 29 não trouxe recursos novos para o SUS como estava previsto? 

Por que se aprofunda a precarização da força de trabalho na saúde e a terceirização dos serviços de saúde? 

Por que se mantém a DRU (Desvinculação das Receitas da União)? 

Porque há uma Lei de Responsabilidade Fiscal draconiana e nenhuma lei de responsabilidade sanitária ou social? 

Por que não se respeita o controle social (Participação da Comunidade no SUS)?

A Frente Nacional contra a Privatização da Saúde tem empreendido lutas contra todas as formas de privatização que vem ocorrendo após os anos 1990. Contra o desmonte do SUS público estatal e às medidas do atual governo de fortalecimento do setor privado de saúde, a Frente reafirma suas bandeiras:

- Defesa incondicional do SUS público, estatal, universal, de qualidade e sob comando direto do Estado

- Contra todas as formas de privatização da rede pública de serviços: OSs, OSCIPs, Fundações Estatais de Direito Privado, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares; e Parcerias Público Privadas

- Contra a implantação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), impedindo a terceirização dos Hospitais Universitários e de ensino federais

- Pela Inconstitucionalidade das Leis que criam as Organizações Sociais (OSs) e a EBSERH

- Defesa de investimento de recursos públicos no setor público

- Pela gestão e serviços públicos de qualidade

- Defesa de concursos públicos RJU (Regime Jurídico Único) e da carreira pública no Serviço Público

- Contra todas as formas de precarização do trabalho

- Pelo fim da Desvinculação das Receitas da União (DRU)

- Exigência de 10% da receita corrente bruta da União para a saúde

- Defesa da implementação da Reforma Psiquiátrica com ampliação e fortalecimento da rede de atenção psicossocial. Contra as internações compulsórias e a privatização dos recursos destinados à saúde mental via ampliação das comunidades terapêuticas

- Pela efetivação do Controle Social Democrático

- Por uma sociedade justa, plena de vida, sem discriminação de gênero, etnia, raça, orientação sexual, sem divisão de classes sociais!


FRENTE NACIONAL CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA SAÚDE
Março de 2013

Divulgado no site da Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde
dia 7 de março de 2013.